sexta-feira, 18 de julho de 2008

Presets

Se os Depeche Mode de finais de 80 se encontrassem com os Nitzer Ebb e fizessem um disco produzido a meias pelos Daft Punk e Justice, o resultado não andaria longe do que se ouve em "Apocalypso", o segundo álbum dos Presets. Três anos depois da promissora estreia em "Beams", o regresso da dupla volta a revisitar referências onde a década de 80 tem um peso considerável mas cuja produção reflecte, contudo, métodos e ideias do presente.

Julian Hamilton e Kimberley Moyes mergulham aqui em sonoridades mais obscuras do que a que marca outros projectos electrónicos australianos - como os Cut Copy, Van She ou Midnight Juggernauts -, movendo-se por territórios de forte carga industrial, por vezes gótica, onde a synth-pop convive frequentemente com a EBM (electronic body music).

Quase todos os temas de "Apocalypso" demonstram uma assinalável eficácia nas pistas de dança, com texturas que encorajam várias audições e vão revelando, aos poucos, novos pormenores escondidos entre a voz grave de Hamilton e as manipulações electrónicas que a complementam. Este cuidado na produção é, aliás, um dos trunfos do disco, e compensa a mediania que acaba por percorrer grande parte do alinhamento, marcado por canções sempre competentes mas só a espaços realmente desafiantes.

"My People", o primeiro single, é um dos momentos mais fortes, cuja pujança do refrão é tão incendiária como os acessos de punk digital de uns Prodigy na fase "The Fat of the Land".
Igualmente viciante, e não por acaso outro single, "This Boy's in Love" é uma pérola de arquitectura sonora, onde ondulações rítmicas quase trance se misturam com coros em falsete numa canção de forte travo europop, contando uma história de amor larger than life. Se por um lado resulta numa amálgama kitsch, não deixa de ser um belíssimo episódio de assombro pop, que prova o que os Presets são capazes de fazer quando estão inspirados.

O álbum não atinge uma fasquia tão elevada em nenhum outro momento, ainda que ofereça temas interessantes como "Together", cuja aura épica e tribal lembra os Young Gods, "Talk Like That", que arranca com um orgão fantasmagórico antes de disseminar um irresistível ímpeto dançável, ou "If I Know You", balada soturna que poderia ter nascido há duas décadas. Já o electrofunk de "Yippiyo-Ay" vai buscar ideias ao french touch e o curioso instrumental "Aeons" oferece um raro interlúdio de placidez.

Nem sempre capaz de manter o mesmo apelo, "Apocalypso" tem o suficiente para que os Presets sejam um dos nomes a acompanhar na electrónica recente, e não é qualquer banda que é capaz de fazer um disco com potencial para agradar tanto a fãs dos Nine Inch Nails como dos Human League ou dos Rammstein.





Sapo, 17 de Julho de 2008

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