sábado, 6 de fevereiro de 2010

O Sexo I


Entrar num salão de cabeleireiro feminino é mais intoxicante do que viver numa cabana em Chernobyl. Pego na maçaneta da porta, rodo-a e, de repente, os meus passos desaceleram, o meu cabelo esvoaça, os olhares femininos contemplam-me como numa série teenager. Não que eu seja um Brad Pitt em potencial ou porque, de repente, fui abençoado por um manancial de fantasias hetero, mas tal desabafo faz-me bem; haverá outros gays na mesma situação? É o preço a pagar por ser esse salão o único num raio de 5000 km, da minha casa, ou, em última instância, aprendo eu mesmo a arte de cortar relva, interiorizo o meu alter-ego masoquista e corto eu mesmo o meu próprio cabeo, escusando de asfixiar numa sala com mulheres que têm idade para serem minhas tetravôs a babarem-se para cima do meu cabelo ainda por cortar. A quantidade de informações úteis ali concentradas dava para tema de conversa de G8's durante três milénios. Não só G8's mas G9's, G10's, G100's. Em suma, um sem-fim de G's. E não é que G é a letra certa? O ponto G que elas anseiam encontrar e G aquilo que eu sou: gay! gay! gay!

É um mito dizer que os gays se sentem à vontade com mulheres. Eu sinto-me como se me estivesse a afundar, alguém me fizesse respiração boca-a-boca e, logo de seguida, me apertasse o pescoço e me lançasse para alto-mar de novo. Suo. Tremo. De certa forma, os salões de cabeleireiro femininos, por norma, possuem a mesma leviandade do sexo.

Quinta descobri que o sexo não passa do esfreganço de partes do corpo às partes do corpo dos outros e que o prazer é um mero simbologismo mental. Não há nada de romântico, metafísico ou mega-decisivo nesse acto. E detesto chegar a esse tipo de conclusões. Contudo, é reconfortante. É reconfortante porque tornando o sexo banal reduz a minha ansiedade em relação a ele e, portanto, consigo passar muito bem com a sensação de que o sexo pode ser conseguido com um estalar de dedos *triic* (esperem, vou ter que terminar o texto, venho já...)

... e que nada muda, eu não mudo, o mundo não muda, só porque não consigo (vou usar uma expressão muito feia mas bem ilustrativa) "esvaziar os tomates" hoje. Não lhe tenho que dizer "corta!" como num filme de porno rasca mas a minha cabeleireira sempre me pergunta, depois de discutir temas como gravidez adolescente, plásticas, página da necrologia no jornal e receitas de empadão com atum: como quer que eu corte?

Eu poderia responder: curto, muito curto. Amanha já está grande outra vez.

Sem comentários: