domingo, 22 de maio de 2011

Lady GaGa - Born This Way (2011)


Quando o videoclipe da «Just Dance» rompeu pelas montras televisas da gigante MTV, a loiríssima Lady GaGa era apenas um nome esquisito de uma potencial wannabe pop a debater-se num mundo dominado por uma concorrência de peso: Britney Spears, Beyonce, Rihanna ou estrelas menores mas, mesmo assim, vorazes como Miley Cyrus.

Os fãs de Gaga, no qual me incluo, que me desculpem, mas até esse facto é semelhante à história (ou mito?) de Madonna. Também ela, quando surgiu pelas mãos de uma então MTV bebé em meteórica ascensão, não passava de uma lambisgóia que se atrevia a misturar metáforas sexuais com temáticas religiosas (e politicas) – quem não se lembra do icónico “Like a Virgin”? -.

Voltando a GaGa: do insosso «Just Dance», passando pelo esquecível «Beautiful, Dirty, Rich», até ao torpedo ultra-sónico de «Pokerface», à doçura dúbia de «Eh, Eh (Nothing Else I Can Say)», à ousadia sideral de «LoveGame» e à inteligência perversa de «Parapazzi» com o aparato da mega-produção do vídeo e consequente show melodramático nos MTV Awards 2009, lá está, sobre a alçada da MTV, GaGa se transformou. E o mundo também.

Isto não pretende ser uma história de vida da auto-intitulada Rainha da Pop mas é bom saber do que estamos a falar. Do «The Fame» à «The Fame: Monster», GaGa transformou-se numa das maiores estrelas pop mundiais até aos nossos dias e isso não é uma opinião, é um facto (por mais que eu conteste pelas questões capitalistas e deterministas que tal facto simboliza…).

Ao sempre difícil segundo álbum, GaGa decide caprichar e adensar a pop do ultimo álbum, perdão, EP, concedendo-lhe uma ar ainda mais sinistro, uma sonoridade ainda mais house – quem pensou que Kele Orekeke tinha inventado a “black house” desengane-se - pincelada com imagéticas rock/punk e doses industriais de religião, sexo e referencias multiculturais (gays, mexicanos, árabes, etc), às quais Madonna sedimentou a sua carreira nas três ultimas décadas passadas. GaGa perde a docilidade pop de «The Fame» e ganha traquejo na venta, persistindo com as letras imperceptíveis, infantilizadas e sem sentido, em alguns momentos.

Passando ao que interessa. «Born This Way», apesar de parecer difuso ou um plágio declarado a Madonna nas temáticas, consegue ser um bom álbum de entretenimento, onde a pop tem sido pródiga. Analisando caso a caso.


1. Marry The Night

“Marry The Night” começa em tons melodiosos, confessionais e angustiantes para colmatar num raio de energia electro, impulsionado por uma necessidade de combater todas as maleitas do mundo. «Forbidden Love» de Madonna à mistura com a onda rock de Pink e com metáforas alusivas à “noite” (e aos gays) são as melhores formas de descrever uma das melhores canções do álbum que só peca pela profusão sonora do final.


Nota: 5


2. Born This Way


Pode-se pensar que tudo o que já foi dito sobre a canção single do álbum tem sido suficiente mas nada é suficiente para este hino poderoso sobre o respeito e a diversidade, a começar pela actuação nos Grammys. Convêm no entanto salientar (e infelizmente para quem ficou descontente com o single) que «Born This Way» é uma das melhores: enérgica, corajosa e intransigente. GaGa já nasceu assim. Nota: 5

3. Government Hooker

Não se percebe muito bem se este poema pós-moderno é uma crítica aos governos norte-americanos (ou outros) ou uma atitude radical de GaGa ao responder às críticas sexistas (ou outras) que a circundam. Ou talvez seja as duas contando com o carácter ambíguo do álbum e da própria canção. O refrão parece uma revitalização de «Don’t You Want Me» dos Human League, o que não é mau de todo.

Nota: 4


4. Judas


Em nenhuma outra canção se nota que GaGa pretendeu escrever o seu próprio «Like a Prayer». A atitude provocante de colocar Maria Madalena indecisa entre o amor do (assexualizado) Cristo e o rei dos traidores, Judas, é equivalente à de Madonna ao rezar a um Cristo negro de uma forma, digamos, muito pouco convencional. «Judas» pode muito bem marcar também a identidade da sonoridade do álbum (Judas Priest). O único senão é que, aqui, GaGa mostra ser muito preguiçosa: «Judas» não passa de uma reactualização da «Bad Romance» com samples de «Personal Jesus» dos Depeche Mode. Mas não lhe vou atirar pedras, valeu a intenção.

Nota: 5

5. Americano

Quer como crítica à hipocrisia do governo norte-americano ao responder (ou a não responder) à imigração mexicana, quer como resposta ao mega-hit «Papa-americano» ou até mesmo como forma de atingir a comunidade latina dos EUA, falha redondamente. Porque a canção tem uma sonoridade muito mais italiana do que espanhola ou mexicana e distancia-se de formas pop convencionais. Como ressurgimento da sua veia italiana, a música pode-lhe fazer jus.

Nota: 4


6. Hair

É a canção que mais se aproxima das canções inocentes do primeiro álbum, até na letra que parece reportar à fase inicial de Spears. Contudo, não perde o carácter efusivo das anteriores (música de estádio, sim, mas com o charme dos instrumentos de sopro) com metáforas que interligam “cabelo”, “identidade” e “liberdade” como resposta a conflitos parentais. Temos potencial terceiro single.

Nota: 4

7. Scheibe

O desfile para Mugler e a cultura de Berlim despertou-lhe os sentidos para produzir esta maquinal canção que parece ter sido retirada do documentário polémico de «Bruno» e enfatiza o sentido femme fatale do mulherio. Poderosa, pois claro.

Nota: 5


8. Bloody Mary

Era para constatar no cardápio de «The Fame: Monster» mas fez bem em colocar aqui. É a tradução da consternação de um amor falhado (ou de um sexismo indeclarado) com referências claras a imagéticas religiosas católicas (Maria, Jesus). Pela assexualização que esses simbolismos podem conceder à canção, era bom que ela se contivesse porque a canção é óptima para afogar as mágoas e quando se afoga as magoas não se está para recitar a bíblia. Tirando esse constrangimento, atrever-me-ia a dizer que «Bloody Mary» é uma das canções mais sentimentais de GaGa.

Nota: 4

9. Bad Kids

Imaculadamente inocente e revestida de tentativas de transforma-la em rock. Pela primeira vez, dou um “três”. Sim, sou um bad kid.

Nota: 3

10. Highway Unicorn (Road 2 Love)

Imaginem uma reunião entre Cher, Donna Summers, Grace Jones e Whitney Houston. Peguem na explosão europop de Cher, misturem com o psicadelismo cândido de Summers, adicionem a voz galáctica de Whitney (ok, reduzam um pouco) e deixem espaço para a extravagância alienígena de Grace. Voilá, esta canção é algo assim.

Nota: 4

11. Heavy Mental Lover

Aposto que esta foi produzida à ultima da hora e metida à força no álbum. GaGa quis tanto ser original que se transformou numa Kylie Minogue remixada por Jakatta. Apesar de não ser má, se a ouvisse numa rádio qualquer botaria as minhas mãos no fogo de que não se tratava de GaGa. Para piorar, as doses industriais de vocoder despersonalizam totalmente uma canção onde os “uh uhs” de GaGa viajam tresloucados.

Nota: 3

12. Electric Chapel

Foi a primeira canção do álbum que gostei à primeira. Original pelas metáforas religiosas e sexuais que mobiliza, o electro-pop exagerado que gravita no perímetro divisório entre o house azeiteiro e a despersonalização não pairam por estas bandas, a letra, apesar de não ser um atestado de inteligência, é bastante simples, acessível e pertinente. Bom serviço à pop.

Nota: 5 (posso dar um 10?)

13. You & I

Ligeiramente diferente da faixa que vazou há meses na Internet, «You & I» é o regresso da “GaGa do piano” paredes meias com batidas do tipo “We Willl Rock You” dos Queen e coros à Shania Twain. Ou seja, a pior canção do álbum.

Nota: 2

14. Edge of Glory


O provável terceiro single de GaGa não entra facilmente no ouvido mas, uma vez assimilado, é impossível tira-lo da cabeça. Cumpre os pré-requisitos dos hits de discotecas tropicais, a brincar às escondidas com tons clássicos de jazzie, e presta um bom serviço à dança. Avaliar pelas vendas do novo álbum de GaGa e a sua popularidade, tem também uma letra sincera: ela está no pico da glória.

Nota: 5

15. Fashion of His Love

Difusa e apressada. Tão apressada que recorre a loops da não lançada “Then you’d love Me”. Há piores? Há, mas não me convenceu.

Nota: 2

Nota: As canções “The Queen” e “Black Jesus + Amen Fashion” ainda não tive oportunidade de ouvir.

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