
Ora bem, assiste-se hoje em dia a uma reformulação dos argumentos CONTRA a homossexualidade, disfarçados de argumentos CONTRA a igualdade de direitos (no que diz respeito ao casamento e à adopção). Esse disfarce deve-se essencialmente ao facto de a sociedade tolerar cada vez menos manifestações explicitamente homofóbicas obrigando os homofóbicos, se me permitem a perigosa expressão, “a entrarem no armário”. E perigosa porquê? Porque perante tal cenário constrangedor, os homofóbicos engendraram uma estratégia bem organizada: pegaram nas conceptualizações habituais do movimento LGBT e aplicaram a eles mesmos, ou seja, 1º invertem o preconceito vitimizando-se (“também existe preconceito contra heterossexuais” como se o preconceito tivesse as mesmas proporções em ambos os lados), 2º apresentam-se como grupo defensável passível de discriminação (“também não temos o direito a sermos homofóbicos?” como se a homofobia fosse o desejável nas sociedades democráticas e que se dizem igualitárias ou como se matar gays fosse uma liberdade para a qual lutar), 3º minimizam a discriminação (“oh, toda a gente é discriminada, porquê é que os homossexuais se queixam?” como se a discriminação dos homossexuais fosse tão irrelevante como a discriminação das pessoas que preferem meias brancas ou usam óculos).
Um dos argumentos (na impossibilidade de usarem o velhíssimo argumento da reprodução) é o ataque à própria estrutura de uma relação homossexual. Por exemplo, “os homossexuais são mais promíscuos”, os homossexuais são mais infiéis”, “os homossexuais não conseguem manter relações estáveis por muito tempo” (argumentos nada novos, por sinal).
Contudo, um dos argumentos mais utilizados (o lobby anti-gay encontra um argumento e partilha-o com os outros membros para reforçarem-no e darem visibilidade) é a questão da violência doméstica: um argumento que é inclusive esmiuçado pela comunicação social sem hipótese de defesa ou contra-argumentação. A comunicação social sempre tão imparcial. É que quando ela apresenta a contra-argumentação é porque é o lobby gay a funcionar. Irrisório...
Dizer que a violência doméstica afecta mais casais homossexuais do que casais heterossexuais tornou-se o prato do dia por parte do lobby anti-gay. Faz-me lembrar aqueles argumentos, muito comuns, na década de 60/70, sobre a pedofilia: os homossexuais têm maior tendência para a pedofilia. E mostrava-se que os estudos (estudos sem cariz religioso) indicavam o contrário. E contra-argumentava-se: mas os heterossexuais também são em maior número. E nós dizíamos que, mesmo em termos proporcionais havia assimetrias, negativamente, para o lado dos heterossexuais. Sem contar que, quando o crime pedófilo era de cariz homossexual o crime era supramencionado. Dizer “homossexual viola menino” não é a mesma coisa do que dizer “homem viola menina”, pois ninguém diz “heterossexual viola menina”.
O argumento da violência é um argumento conveniente nos tempos que correm. Porquê? Porque estamos na fase de discussão do casamento e da adopção. Como o argumento da pedofilia era conveniente na década de 60/70 quando o que estava em cima da mesa era despatologização da homossexualidade.
Ontem fiquei “doente” quando li no blogue http://www.portugaldospequeninos.blogspot.com/ :
“Aparentemente a chamada “violência doméstica” atinge mais casais same sexers do que casais ditos “normais”. É normal porque a “violência” é a verdadeira “fonte” do amor, do ódio e da paixão, tudo equivalentes. Homens ou mulheres a dois são realidades semelhantes que, mais do que se encontrarem, se enfrentam.”
Ora bem, argumentos a sério? Aqui estão eles:
1 – Em quê que se baseia para fundamentar a sua opinião? Apresente-me estudos, evidências científicas. De preferência, de instituições laicas;
2 – A violência doméstica é uma realidade que tanto afecta casais homossexuais como heterossexuais sendo estes últimos os mais estatisticamente visados. Não porque os heterossexuais são a maioria nem porque estão mais expostos, simplesmente porque é uma realidade com uma razão aleatória. Além disso, são mais as relações heterossexuais que eu conheço com recurso à violência do que relações homossexuais;
3 – Quantas relações homossexuais “saudáveis” essas pessoas conhecem? Não digam, esperem, “muitos, eu até tenho amigos homossexuais” – pois, claro… Essas pessoas vêm um ou dois casos de violência doméstica entre casais constituídos por pessoas do mesmo sexo já acham que podem opinar. Um ou dois casos comparados com os milhares de casos por ano entre casais constituídos por pessoas de sexo diferente (dados da APAV), de facto, é preocupante;
4 – A violência doméstica é muito mais comum nas relações heterossexuais porque o facto de homens e mulheres serem diferentes – tarefas diferenciadas, atitudes diferentes, etc - potencializa a agressão e a hierarquização;
5 – Os homossexuais estão sobre uma pressão maior, devido à homofobia, para levar as suas relações a bom porto. Pressão essa que os heterossexuais desconhecem;
6 – Gostava de acrescentar que os homossexuais são seres humanos e também cometem erros, agora usarem isso para moldar a opinião pública a manifestar-se contra o casamento é atroz. Pegando no argumento da minimização do preconceito homofóbico, permitem-me se desvalorizar a questão da violência.
1 comentário:
Gostei de ler o artigo no Público de domingo passado, sobre este assunto.
Abraço.
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