quarta-feira, 4 de maio de 2011

Ritual Anti-ritual


O que é o casamento da Kate Middleton com o príncipe Williams de Inglaterra, a beatificação do Papa João Paulo II, a Imposição das Insígnias (no polissémico dia 1 de Maio, que era, quer dia da mãe, quer dia do trabalhador/a, quer dia de Imposição, etc) e as conferências (nacionais ou internacionais) na [minha] faculdade têm em comum? Eu explico: a idolatria ritualizada pelo poder que, mais tarde ou mais cedo, se pretende reflectir na realidade institucional (ou ser parte dela), as preocupações com as formalidades, a burocratização milimétrica, o controlo de cada fracção de discurso, a pose corporal que se estende, desde o vestuário e à postura como nos sentamos até à arquitectura do espaço. A esse conjunto de dispositivos, podemos, essencialmente, denominar de “os rituais”.

Os rituais fazem parte de uma estratégia do poder que organiza a sua própria racionalidade numa lógica que se quer dualizada, hierárquica (e.g., a Monarquia ou o Vaticano com todos os seus graus: rei, rainha, papa, bispo, padre; os papéis inseridos num sistema de ensino, também com todos os seus graus: professor(a)/aluno(a), professor(a) catedrático(a)/professora recém-colocado(a), estudante/funcionário(a), etc) e inquestionável.

Os rituais não são pensados ao acaso. São muito bem estruturados num enquadramento ideológico mais largado que se rege por princípios que se querem universais. Não basta eu ter o casamento real britânico se, simultaneamente, eu não (re) criar modelos normativos a serem seguidos por outrem (o “povo” inglês foi exemplo disso). Aliás, a tónica do poder exige uma reprodução que se alastre a todos os cantos do globo (ou mais além, não fosse os devaneios pela colonização espacial – ninguém se atreveria a chamar este nome, claro - uma realidade com meio século).

Esses rituais, volta e meia, são desconstruídos e desfragmentados, consciente ou inconscientemente. É pródiga as tentativas dos media em mencionar as fugas ao protocolo do casamento real britânico ou as dos/as professores/as em apelar à democracia dentro das salas de aula contudo tal realidade é equivocada pois mesmo o imprevisto pode ser enquadrado e previsto ou por vezes, a emancipação também é regulada e tem que se jogar o jogo para que a sua manutenção seja eficaz (e.g., a democracia europeia, que começa hoje a ser posta em causa: Itália, França, Hungria, Finlândia). A questão que se coloca é: conseguimos viver sem eles? Sabendo que posturas anti-sistemas fazem parte de o sistema, é preferível ser pró-sistema então? Esse é o problema e, de um ponto de vista ideológico, o problema de uma “certa esquerda” como a direita adora ganir: a falta de um ritual que questione “os rituais”.

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